terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Meus Orgulhos...tenho razão para tê-los! (Parte A)

Como diz Fernando Pessoa num de seus fabulosos e sinceros poemas:
- Nunca conheci alguém que afirmasse que levou porrada, que perdeu, que caiu, que ficou em situação de inferioridade diante de outra pessoa, que sentiu vontade de chorar e o tivesse feito, enfim, que fosse gente de verdade.
Eu mesmo, certamente, também mantive esta postura machista muitas vezes, já que sou um ser humano, porém, tenho a convicção de que tentei acertar mais do que errei, que visei o interesse dos outros mais do que aos meus próprios, que incentivei muitas pessoas a crescerem socialmente, que passei-lhes informações e conhecimentos, e que me alegrei com as suas vitórias e conquistas.
Neste momento, faço a escolha de um fato ocorrido na minha vida profissional, do qual muito me orgulho, e que gostaria de poder compartilhá-lo com todos aqueles que visitarem meu blog.
Assim, irei contar esta pequena história que está relacionada com o tema do preâmbulo.
Para manter o anonimato dos personagens e dos locais não mencionarei seus nomes, apenas os fatos.
Certa ocasião, trabalhei como Gerente Operacional de um restaurante super badalado, onde a frequência maior era de "globais", desembargadores, juízes, empresários, homens públicos, etc.
Meu trabalho, basicamente, consistia na supervisão da dinâmica do serviço, e na qualidade do atendimento ao cliente, a fim de que ambos estivessem à altura do imponente nome da casa.
Quando comecei a trabalhar neste local, deparei-me com um restaurante que funcionava, realmente, a todo vapor, mas, que começava a perder o glamour de outrora, e já se podia sentir uma sensível diminuição da sua seleta freguesia, principalmente no almoço.
Assim, numa destas noites bem movimentadas, o maître me diz:
- Sr. Jacques, por favor, o cliente da mesa 43 somente fala Francês, e gostaria de ter alguém que pudesse lhe atender neste idioma, o senhor se encarregaria disto?
Sempre gostei de atender aos clientes, mesmo não sendo minha função específica, pois todas as vezes que o faço, coloco-me no lugar deles, tentando descobrir, meio que "mediunicamente", por qual caminho gastronômico deverei caminhar para poder sugerir-lhes os pratos do cardápio que possam ser do seu agrado, e como deveria harmonizá-los para que o vinho pudesse dar aquele "plus" ao colorido final da refeição.
Logicamente, a cada vez que as pessoas me agradeciam na saída do restaurante, ou mesmo quando com um discreto aceno de mão, me chamavam para comentar  a forma como estavam apreciando minhas sugestões, tudo isto me deixava pleno de alegria e com o sentimento do dever cumprido:
Fiz para eles exatamente o que eu gostaria que fizessem para mim, nada mais, nada menos!
Então, aproximei-me da mesa, cumprimentei a senhora e o senhor, disse-lhes meu nome, e a razão de estar ali, ou seja, para ajudá-los a ter um excelente e inesquecível jantar naquela noite.
O senhor, um tanto quanto rebelde, me interpelou bruscamente sobre a sugestão de um vinho, como algo do tipo, "vamos logo ao que interessa".
Perguntei-lhe se eu deveria trazer a carta de vinhos ou se ele gostaria que eu lhe desse alguma sugestão.
Sempre de forma meio rude, (o que depois descobri tratar-se apenas de uma forma de defesa), este senhor disse-me que queria provar, antes, uma taça do vinho que eu prentedia sugerir-lhe.
Com prazer, respondi, e me afastei, indo buscar as taças e o vinho para fazê-los provar.
Ao provarem daquele belo Cabernet Sauvignon, brasileiro, o casal pediu-me que abrisse uma garrafa e mostraram-se muito satisfeitos com esta escolha.
Providenciei com o sommelier para que servisse o vinho, e passei para a etapa do menu.
Seguiram-se as mesmas perguntas, só que agora, mais amável e confiante, o senhor me disse:
- Já que você foi tão hábil com a escolha do vinho, imagino que também o será com a escolha da comida...o que nos recomendaria?
Por alguns segundos meu computador interno somou, dividiu, multiplicou e a sugestão veio como se fosse o meu desejo para jantar naquele momento, assim, sugeri para a senhora umas Costeletas de Cordeiro (Uruguaias), com um suave molho de hortelã, a parte, acompanhadas de Batatas Assadas cortadas em estilo Canoa (bem grandes), sem antes, claro, deixar de exaltar a qualidade das mesmas, e seu tamanho, Nirea 18/20.
Ao seu marido, que já estava meio impaciente, resolvi sugerir-lhe a Galinha d'Angola, assada, servida fatiada como se fosse um maigret, com o molho preparado do seu próprio assado, e servida com um Risoto de Shiitake.
Diante da expressão curiosa referente à Galinha d'Angola (a qual eu já esperava que houvesse, claro), expliquei-lhe tratar-se de uma galinha selvagem, também conhecida no nosso país como "capote", que vôa e dorme nas árvores, que não se reproduz em cativeiro, o que nos obriga a ter que seguí-la, mato adentro, para ver onde irá colocar seus ovos, retirá-los dali , e os "deitarmos" (expressão nordestina) no ninho da galinha comum, para que esta trate de chocá-los.
Acrescentei que também é muito comum, quando a mesma sobrevive aos predadores, vê-la voltar de algum lugar, para o seu ponto de origem, seguida da prole barulhenta.
Enfim, chegou a hora da verdade, e a cozinha, minha principal coadjuvante, ajudou-me na montagem e na apresentação de ambos os pratos que estavam realmente lindos.
Ajudei a servir, e deixei-os tranquilos para que pudessem desfrutar do jantar, recomendando ao garçon para que não deixasse faltar nem vinho nem água nas taças.
Após a sobremesa e o café, este senhor me chama e diz:
- Mon ami, (gostei por demais de ser tratado assim), o jantar estava magnifique!!
Gostaria que você soubesse de uma coisa....sou presidente de uma Multinacional, portanto, estou obrigado a viajar por todo o mundo, constantemente.
Já comi em todos os grandes polos grastronômicos, ou seja, New York, Paris, Londres, Roma, Hong-Kong, etc, porém, em nenhum deles, conheci alguém como o senhor que conseguiu de forma tão elegante, a difícil façanha de: "Transformar palavras em paladar".
Meu coração disparou, meus olhos se encheram de lágrimas, pois, há muitos anos que vinha dizendo que o famoso ditado está errado, ou seja, primeiro comemos com os ouvidos e depois com os olhos, o que simplesmente obriga que um maître seja um orientador gastronômico e não um mero tirador de pedidos.
Madame et Monsieur, não sei os seus nomes e nem sua origem, porém, agradeço todos os dias por tê-los conhecido, e recebido o lindo elogio que me fizeram.
Considero-o um grande prêmio para mim, como profissional da área de Alimentos e Bebidas, e também um grande motivo de orgulho, acho até que mereceria UMA BELA MOLDURA PARA PODER FICAR PENDURADO NA PAREDE DA MINHA CASA.
Jacques .'.

2 comentários:

Denilson Almeida disse...

Parabéns Jacques,

Seus textos só tem melhorado desde o inicio do blog. Espero ter sempre surpresas legais ao visitá-lo como esta experiância sua que foi narrada.
Abçs

Jacques Graicer disse...

Obrigado Denis,
Como sempre vc é um dos meus maiores incentivadores.
Esteja certo de que eu gostaria que existissem mais pessoas lendo minhas crônicas, mas vou dar tempo ao tempo, pois sei que isto acontecerá.
Abraços,
Jacques .'.